Introdução: O desafio do IVA Dual
Com a aprovação da Reforma Tributária e a instituição do IVA dual, composto pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) federal e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) estadual e municipal, surgem debates sobre como simplificar um sistema tributário historicamente complexo e fragmentado. Um dos maiores desafios será definir o local da operação tributável, aspecto que já provoca intensos conflitos no sistema atual e promete continuar sendo um ponto controverso no novo regime.
Se você já enfrentou problemas para entender onde incide o ISS ou o ICMS na prestação de serviços ou circulação de mercadorias, prepare-se: o IVA dual trará mudanças e novas dúvidas. Neste artigo, explicamos as principais questões envolvendo o local da operação, ilustrando com exemplos práticos do dia a dia empresarial.
O Problema: A confusão no sistema atual
No modelo atual, os entes subnacionais (estados e municípios) têm ampla autonomia para legislar sobre ICMS e ISS. Isso resulta em:
- 27 legislações estaduais para o ICMS e inúmeras normas sobre substituição tributária e antecipação de imposto.
- Milhares de leis municipais para o ISS, cada uma com regras próprias para definir onde o tributo deve ser recolhido.
Por exemplo, o ICMS sobre importação de mercadorias frequentemente gera conflitos entre o estado do destinatário jurídico (a empresa que importa) e o do destinatário físico (onde o produto chega). Já o ISS enfrenta disputas semelhantes, como no caso de empresas de software, onde muitas vezes se discute se o imposto é devido no local do tomador ou do prestador do serviço.
Essa fragmentação cria insegurança jurídica e custos elevados de compliance para empresas, que precisam atender a múltiplos regulamentos.
A Solução: O que o IVA dual propõe
Com o IVA dual, a tributação sobre consumo será baseada no princípio do destino, ou seja, o imposto será recolhido no local onde o bem ou serviço é consumido, e não onde é produzido. Isso elimina muitos conflitos existentes, mas também traz novos desafios.
Por exemplo, a Lei Complementar 214/2025, que regulamenta o IVA dual, apresenta mais de 10 critérios para determinar o local da operação tributável. Entre eles:
- Serviços prestados presencialmente terão o imposto devido no local da prestação.
- Serviços realizados parcialmente a distância (como consultorias jurídicas online) serão tributados no local do domicílio do tomador.
Esses critérios são positivos por trazerem uma abordagem padronizada, mas ainda faltam precedentes judiciais que orientem a aplicação prática dessas regras.
Exemplo Prático 1: Consultoria jurídica presencial e online
Imagine um advogado que atende um cliente em seu escritório em São Paulo. Nesse caso, o IBS seria recolhido no município de São Paulo.
Agora, se parte da consulta é realizada presencialmente e, posteriormente, o cliente pede esclarecimentos adicionais por videoconferência, a situação muda: o IBS poderá ser devido no local do domicílio do cliente.
Exemplo Prático 2: Venda de software com suporte técnico
Uma empresa em Curitiba vende software para uma cliente em Recife. A venda do software, sendo um bem digital, terá o imposto devido ao estado de Pernambuco (local do tomador). No entanto, o suporte técnico, que é um serviço, também seguirá a regra do domicílio do tomador, evitando conflitos entre municípios.
O Desafio: Conflitos ainda inevitáveis
Apesar da promessa de simplificação, conflitos em torno do local da operação são inerentes a qualquer sistema que combina competência tributária de estados e municípios. Alguns cenários podem ser particularmente desafiadores, como:
- Definir o local de tributação para marketplaces, onde consumidores e fornecedores estão espalhados por diferentes localidades.
- Serviços híbridos, como academias que oferecem aulas presenciais e online.
Essas situações exigirão regulamentação complementar e interpretações jurisprudenciais para evitar litígios.