Holding familiar: entenda como funciona
Segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), embora 90% das empresas possuam perfil familiar, todavia, nem todas as empresas familiares chegam à terceira geração. Isso é decorrente de uma série de fatores, dentre os quais, a falta do planejamento sucessório e patrimonial. Com vistas a proteger o patrimônio da família, […]
Segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), embora 90% das empresas possuam perfil familiar, todavia, nem todas as empresas familiares chegam à terceira geração.
Isso é decorrente de uma série de fatores, dentre os quais, a falta do planejamento sucessório e patrimonial. Com vistas a proteger o patrimônio da família, a utilização de uma importante ferramenta de organização e gestão tem crescido nos últimos anos: a holding familiar.
Esclareça as principais dúvidas sobre o assunto.
O que é holding familiar?
A holding familiar trata-se de uma pessoa jurídica que atuará como titular de bens e direitos. Pode-se citar como exemplo o Banco Itaú, no qual suas empresas de negócios financeiros são controladas pelo Banco Itaú Holding Financeira S.A. Essa prática pode ter finalidades variadas, no caso da holding familiar, atende aos interesses da organização e gestão do patrimônio de uma família.
Por exemplo, você já pensou em como é organizado e gerido o patrimônio familiar de grandes grupos empresariais, como Magazine Luiza S.A. e Globo Comunicações?
Naturalmente, há preocupação com o planejamento patrimonial, dilapidação e divisão em caso de sucessão hereditária. Essas empresas adotaram como ferramenta a holding familiar.
Funciona da seguinte maneira: o patrimônio da família é transferido para a holding familiar. Ao invés de, na sucessão, os herdeiros receberem parcelas do patrimônio do falecido, eles receberão suas quotas ou ações, de acordo com o tipo societário escolhido.
Para que serve a holding familiar?
A holding familiar tem como finalidade a organização e gestão do patrimônio familiar. Holding vem do inglês to hold, que significa deter, segurar. A ideia é essa: organizar e gerir o patrimônio familiar, de modo a protegê-lo da dilapidação e interferência de terceiros.
Qual lei regulamenta a holding familiar?
A holding está prevista na Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/1976), que a conceitua como uma companhia que tem por objeto participar de outras sociedades.
Tendo em vista que a legislação brasileira permite a criação de sociedade com qualquer objeto social, desde que seja lícito, possível, determinado ou determinável, não há impedimentos para a criação da holding familiar.
Qual o tipo societário de uma holding familiar?
Ao estabelecer o tipo societário entendemos que a holding familiar deve ser uma sociedade empresária.
Lembramos que as sociedades empresárias são as seguintes: sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples, sociedade limitada, sociedade anônima e sociedade em comandita por ações.
A holding familiar deve estar em conformidade com o art. 2º, §3º da Lei 6.404/1976, que regulamenta a existência da holding, podendo ser uma sociedade por ações ou outra modalidade de sociedade empresarial que aplica-se subsidiariamente a Lei das Sociedades Anônimas, como por exemplo a sociedade limitada.
É imprescindível o auxílio de um profissional de direito especializado, que poderá identificar o perfil da família, o patrimônio existente, conflitos e interesses, a fim de definir qual é a espécie societária mais adequada.
Quais são as principais atividades econômicas das empresas na modalidade holding familiar?
Em geral, o objetivo principal da holding familiar é exercer a titularidade de quotas ou por ações (holding pura). O conceito de holding familiar deve ser entendido como planejamento familiar que pode compreender a existência de uma ou mais sociedades empresárias para planejar e controlar o patrimônio e negócios de uma familiar.
Considerando a finalidade única de aglutinar o patrimônio da família, podemos denominar a sociedade empresária de holding patrimonial.
Pode a holding familiar, também, servir ao controle e/ou administração das atividades desenvolvidas pelas empresas que participam (holding de controle e holding de administração, respectivamente).
Existe uma outra modalidade, na qual a holding familiar terá como objetivo exercer a titularidade de quotas ou ações, e, simultaneamente, atividades empresariais, por exemplo, produção de bens, prestação de serviços (holding mista).
A holding familiar tem como finalidade atender aos interesses da família, sendo assim, a depender do contexto, poderá adotar qualquer uma das formas mencionadas, ou um conjunto delas.
Qual o capital social de uma holding familiar?
O capital social consiste no valor que será investido pelos sócios da empresa. Dessa forma, o contrato social ou estatuto social definirá o montante, em moeda corrente. Distribuídas ou subscritas, as cotas ou por ações, o capital deverá ser integralizado, isto é, transfere-se para a sociedade os valores correspondentes a elas.
Em regra o capital social irá representar os valores dos bens, direitos ou créditos que serão transmitidos da pessoa física para a pessoa jurídica.
Como transferir bens para holding familiar?
O capital social da holding familiar pode ser integralizado através da transferência de bens, por exemplo, imóveis, móveis, direitos pessoais com expressão econômica, etc.
Caso se trate de uma sociedade limitada, esses bens deverão ter expressão econômica que lhes permitam a avaliação.
Nas sociedades por ações, para que esse bem seja incorporado, é necessário que passe por avaliação por três peritos ou por empresa especializada (art. 8º da Lei 6.404/76). Nelas, não se exige escritura pública para a incorporação de imóveis. A ata da assembleia-geral que aprovar a incorporação do bem poderá ser levada ao Registro de Imóveis. Ela deverá identificá-lo com precisão (arts. 89, 98, §§ 2º e 3° da Lei 6.404/76).
Deve ser levado em consideração os propósitos traçados para holding familiar, para fins de determinar os valores a serem considerados para a transação, quais sejam o valor de aquisição (lançados no IRPF) ou o valor de mercado atual dos bens.
É importante observar que não é necessário transferir todo o patrimônio da família para a holding familiar, pode-se escolher quais bens vão integralizar o seu capital social. Depois de transferidos, esses bens serão de propriedade da holding familiar, dos seus sócios, os titulares das quotas ou por ações, ao invés dos bens propriamente ditos.
Como é o contrato social de uma holding familiar?
O contrato social enfatiza a pessoa dos contratantes, no caso, os membros da família, e o seu vínculo. Desse modo, todos os sócios são nomeados e qualificados, obrigatoriamente, no ato constitutivo. Logo, com a alteração da composição societária, o contrato social também deverá ser alterado.
Nas sociedades contratuais, o capital é dividido em quotas, sendo que quando entre as pretensões da criação da holding familiar está o planejamento sucessório do patrimônio para os herdeiros, a quotas serão transmitidas através de doação ainda em vida dos titulares dos bens, o que gerar a necessidade de uma melhor estruturação do contrato social.
Neste contexto, de proteção e planejamento, algumas cláusulas especiais podem ser previstas no contrato social da holding familiar, a depender das preocupações da família:
Inalienabilidade: impede o beneficiário da doação ou herança de vender, doar ou dar como pagamento o bem recebido, por prazo determinado ou indeterminado. Implica também em impenhorabilidade e incomunicabilidade (art. 1911 do Código Civil).
Impenhorabilidade: impede que o bem seja penhorado para saldar dívidas.
Incomunicabilidade: os bens são retirados da comunhão, ou seja, não podem ser repartidos com o cônjuge ou companheiro em caso de separação (art. 1668 do Código Civil).
Uma consultoria jurídica especializada irá assegurar que o contrato social da holding familiar atende às necessidades da família.
O que é necessário para abrir uma holding familiar?
Antes de abrir uma holding familiar, é preciso analisar o patrimônio da família, empresas, eventuais dívidas, conflitos de interesse e até mesmo o regime de casamento daqueles que serão os sócios. Todos esses fatores podem influenciar na espécie societária adotada e nas cláusulas do contrato social.
O primeiro passo é muito simples, bastando a abertura de uma sociedade empresária, que será registrada nas Juntas Comerciais e poderá pedir recuperação judicial.
Posteriormente são realizadas as alterações societárias visando a transferência do patrimônio através do aumento do capital social e sua respectiva integralização.
Os demais passos seguirão conforme os planejamento e finalidades traçadas, sendo promovidas as alterações societárias que visam a doação de quotas ou ações para os herdeiros e a estipulação de cláusulas societárias especiais que visam dar maior segurança e controle para o titular dos bens transmitidos à sociedade.
Quem pode ser sócio de holding familiar?
Em geral, por causa da sua finalidade, a holding familiar é formada por membros de uma mesma família. Inclusive, os cônjuges poderão ser sócios entre si, exceto se o regime do casamento for comunhão universal de bens ou separação obrigatória (art. 977 do Código Civil).
Também pode ser sócio o incapaz, absoluta ou relativamente, desde que não exerça a administração da sociedade, que o capital social esteja completamente integralizado e seja assistido ou representado, conforme o caso (art. 974, § 3°, do Código Civil).
Quem pode administrar uma holding familiar?
O ato constitutivo definirá quem será o responsável pela administração da holding familiar. Nesse ato, também estará previsto quais serão os poderes e atribuições do administrador. Um ato constitutivo claro e detalhado quanto a esse aspecto trará ainda mais segurança aos interesses dos sócios.
Cabe ressaltar que a lei estabelece um rol de pessoas impedidas de exercer a administração societária:
- Magistrados e membros do Ministério Público;
- Falidos, se não forem declaradas extintas as suas obrigações;
- Agentes públicos;
- Estrangeiros com visto provisório;
- Militares da ativa;
- Pessoas moralmente inidôneas.
Se a holding familiar for sociedade limitada, pode ser nomeado alguém que não seja sócio para administrá-la, o que abre espaço para que seja contratado um administrador com experiência na área ou alguma pessoa de confiança.
Desse modo, a família mantém o controle sobre a empresa, possuindo mais flexibilidade em eventual dispensa do administrador, caso ele não cumpra com êxito o seu papel, do que teria se a empresa fosse administrada por um herdeiro.
Outra possibilidade é administração coletiva, na qual todos os sócios são, ao mesmo tempo, administradores. Essa modalidade demandaria dos sócios deliberações frequentes sobre o direcionamento dos negócios.
Qual o custo mensal de uma holding familiar?
Para abrir uma holding familiar, os custos iniciais serão as despesas comuns com as taxas estabelecidas pelas Juntas Comerciais relacionadas a abertura da empresa e alterações societárias..
Quanto à transferência dos bens para a pessoa jurídica, será necessário custear os emolumentos de transferência de propriedade perante os Cartórios de Registro de Imóveis.
Destacamos que em regra não será necessário o pagamento de ITBI por haver imunidade constitucional na integralização do capital social com os bens, sendo ainda, desnecessária a lavratura de escritura pública, sendo o contrato social o título hábil para a transferência dos bens.
Também será devido o imposto de transmissão causa mortis e doação (ITCMD), gerado em razão da doação das quotas para os herdeiros; honorários advocatícios e contabilidade.
Recomenda-se que a holding familiar seja acompanhada por um contador, ainda que não realize atividades negociais, e por um advogado especializado na área. Os custos são variáveis, mas tendem a ser menores do que uma situação limite de inventário sem planejamento sucessório.
Quais as vantagens de uma holding familiar?
A holding familiar é vantajosa para qualquer família que possui patrimônio e que pretenda que no futuro os bens sejam transferidos para os herdeiros, uma vez que por meio dela poderá ser feito um planejamento sucessório além de se obter uma vantajosa redução nos custos com tributos e despesas quando comparado com o processo de inventário.
Nas empresas familiares, geralmente, o ambiente familiar se mistura com a atividade empresária. A holding familiar pode minimizar esses conflitos, uma vez que será responsável pelo controle do grupo de empresas.
Outro fator que faz com que a holding familiar evite que conflitos familiares interfiram na atividade econômica é a distribuição de funções conforme a aptidão de cada membro. Todos os familiares tornam-se sócios e recebem dividendos proporcionais à sua participação na sociedade.
Pode-se recorrer a um administrador profissional que se encarregue da holding, de modo que eventuais herdeiros não capacitados não necessitem participar da direção, mas mantenham o controle sobre as empresas. Dessa forma, garante-se que o patrimônio beneficiará gerações ao longo do tempo.
Muitas empresas familiares não têm um plano de sucessão. Sabe-se que o inventário judicial pode ser burocrático e se alongar por anos, nos quais o patrimônio ficaria impedido. Com a holding familiar, é seguido aquilo que foi previsto no planejamento patrimonial e sucessório, o que proporciona a continuidade da atividade empresarial.
Além disso, evita que, com a sucessão hereditária, a disputa pelo poder entre os herdeiros faça com que as quotas ou ações saiam do controle da família.
Outro aspecto que torna a holding familiar atrativa é a redução da carga tributária. Sem dúvida, sua tributação é menor do que aquela devida em caso de inventário, o que a torna um instrumento, também, de planejamento tributário.
Quais as desvantagens de uma holding familiar?
Podemos categoricamente afirmar que a principal desvantagem é não fazer uma holding familiar, ou seja, deixar que todos os bens conquistados ao longo de uma vida sejam em parte perdidos com os custos altos com o processo de inventário no caso de falecimento ou objeto de disputa entre os herdeiros no caso de empresas, o que é muito comum.
É preciso analisar o perfil, o patrimônio, os interesses e conflitos familiares para saber se a holding familiar é a ferramenta mais adequada. Em poucos casos, a sua instituição poderá não ser recomendada, o que deve ser avaliado com o auxílio de um especialista.
Poderá ser considerada desvantajosa as holdings criadas sem a observância das normas legais, em especial os regulamentos tributários, uma vez que poderá aumentar a carga tributária em alguns casos específicos.
Para evitar as desvantagens apontadas, é primordial que haja um planejamento prévio, com o estudo de viabilidade e a organização de todos o patrimônio, levando em consideração a destinação dada e as características daquela família, sempre contando com o auxílio de profissionais que sejam especializados neste tipo de planejamento.
Como a holding familiar protege o patrimônio?
Diante de um inventário, a holding familiar evitará conflitos entre os sucessores em razão da falta de planejamento patrimonial. Esse planejamento pode ser realizado em vida pelo empresário, que já irá aferir como será conduzida a atividade negocial após o seu falecimento e quem possui capacidade de gerência. Além disso, pode-se afastar herdeiros que desejam administrar a herança sem ter capacidade para tal, ao lançar mão de um administrador profissional.
Tendo sido transferidos os bens da família para a holding familiar, ela será a proprietária, enquanto os membros da família serão sócios, titulares de quotas ou ações. As quotas ou ações poderão ser doadas em vida com melhor planejamento. Desse modo, evita-se que, em razão da sucessão hereditária, o patrimônio seja fragmentado e o controle que a família exerce sobre as sociedades, enfraquecido.
Ainda no intuito de evitar conflitos conjugais, os pais podem doar para os filhos quotas ou ações com cláusula de incomunicabilidade, isto é, esses títulos não serão alvo de divisão diante da separação, com exceção dos juros e dividendos havidos durante o casamento.
Da mesma forma protege o patrimônio de eventuais dívidas dos herdeiros considerando que as quotas ou ações podem lhe ser transmitidas com cláusula de impenhorabilidade.
Por fim, não se pode deixar de considerar que o planejamento patrimonial através da holding familiar evita a perda de parte do patrimônio no caso de inventário, em que muitos casos os herdeiros acabam vendendo parte dos bens para quitar impostos e custos com este tipo de procedimento.
Contar com o auxílio de uma assessoria jurídica especializada esclarecerá se a holding familiar atende ao perfil, patrimônio, conflitos e interesses da família.